O estranho tratamento de transplante fecal
Qual seria a maneira mais bizarra que você poderia imaginar para tentar curar uma doença ou até mesmo salvar uma vida? Pois nos últimos anos uma técnica para ajudar a combater uma séria doença intestinal tem crescido bastante. Esta técnica é nada mais nada menos que um transplante fecal.
Dentro do nosso intestino possuímos uma grande quantidade de bactérias que ajudam na digestão dos alimentos que ingerimos e, como “recompensa” conseguem se alimentar e crescer também. Este conjunto de bactérias é chamado de flora intestinal. Porém, além dessa troca de favores, conhecida como simbiose ou mutualismo, elas possuem outra função muito importante. Estas bactérias são inofensivas para nós e como existem em imensa quantidade, não permitem o crescimento de bactérias que podem ser nocivas a nossa saúde.
O problema é que as vezes, quando há um distúrbio em nossa flora intestinal, causada por exemplo por uma diarreia ou devido a antibióticos para tratar outras doenças, eliminamos grande parte das nossas bactérias, abrindo espaço para o crescimento de bactérias que podem nos trazer doenças. Uma dessas bactérias é a Clostridium difficile. Esta bactéria provoca fortes diarreias devido a uma toxina liberada e acaba por danificar o cólon. Quando isso acontece, a bactéria se espalha para a corrente sanguínea.
Atualmente, não há dados estatísticos para esta doença no Brasil, mas a CDC (Centro de Controle de Doenças) estima que nos EUA ocorrem 453.000 casos por ano com aproximadamente 29.000 mortes. Mais alarmante ainda, uma a cada nove pessoas morrem depois de 30 dias do diagnóstico.
Atualmente, o combate a esta doença é focado na utilização de mais antibióticos, na tentativa de eliminar o C. difficile. O problema é que esta bactéria é bastante resistente, os antibióticos resolvem apenas 30% dos casos. Assim, um novo tratamento surgiu, o transplante de conteúdo fecal. Sendo eficiente em 90% dos casos.
O transplante, conhecido cientificamente por transplante de microbiota fecal (FMT – Fecal Microbiota Transplant, em inglês), coleta o material fecal de uma pessoa com sua flora intestinal saudável e insere por via oral ou anal, através de tubos, no intestino do paciente. Assim, as bactérias que não nos fazem mal vão competir pelo espaço com as bactérias C. difficile, e impedir sua proliferação.
Em 2010 houve uma grande repercussão do caso em que o marido salvou a vida de sua esposa através de doação de fezes. Sua esposa estava em estado grave para essa doença e as tentativas de cura por antibióticos não funcionaram. Mais recente, em 2016, outro caso de vida ou morte, em que uma filha foi salva pelo transplante de fezes de seu pai.
O transplante de fezes pode ser a chave para cura de várias doenças intestinais, através da recomposição da flora intestinal, mas por enquanto apenas é permitido para os casos de C. difficile. O que será que o futuro nos dirá?