O Tardígrada
Nosso mundo está repleto de criaturas fascinantes, as vezes parecendo que saíram da mala de Newt Scamander de Animais Fantásticos e onde habitam. Provavelmente, milhares delas ainda não foram descobertas, enquanto outras encontram-se bem documentadas. Apresento-lhes então, o Tardígrada!
O tardígrada é um grupo irmão dos artrópodes (insetos, aracnídeos, crustáceos, etc), de aproximadamente 0,5 mm, popularmente conhecidos como ursos d’água. Os tardígradas geralmente se alimentam do conteúdo celular de plantas ou pequenos invertebrados (às vezes até de outros tardígradas). Porém, não é pelo seu pequeno tamanho, nem pela sua aparência bonitinha que estes animais são conhecidos, mas sim pela sua incrível capacidade de sobreviver nas mais diversas adversidades, nas quais a maioria dos seres vivos não aguentariam poucas horas.
Os tardígradas, quando necessário, podem suspender seu metabolismo, entrando em um estado chamado de criptobiose, no qual podem sobreviver em “dormência” por até 10 anos. Quando em criptobiose, os tardígradas baixam seu metabolismo para 0,01% e o nível de água no seu corpo pode ser reduzido para até 3% do normal. Finalmente, uma camada dupla de cutícula reveste seu corpo, protegendo-o até que o ambiente se torne propício novamente.
Confiram abaixo quais as condições estremas que os tardígradas conseguem suportar:
Temperatura:
Para vocês terem uma noção, os tardígradas podem sobreviver por alguns minutos em temperaturas baixíssimas de aproximadamente -200ºC até temperaturas elevadas de 70ºC.
Desidratação:
Quando encontram um ambiente seco, os tardígradas podem entrar em criptobiose, reduzindo a quantidade de água corporal de 85% para 3%. Este mesmo efeito ocorre quando estes animais se deparam com temperaturas muito baixas. Como a água expande quando congela, a desidratação evita que os tardígradas literalmente explodam quando congelados.
Pressão:
Os tardígradas podem sobreviver a uma ampla variedade de pressões, desde extremamente baixas como o vácuo até incríveis níveis de pressões 1.200 vezes maior que a pressão atmosférica. Algumas espécies conseguem sobreviver a pressões de 6000 atm, o que é aproximadamente 6 vezes intensa que a pressão da parte mais profunda conhecida do oceano. Estes animais podem até sobreviver no espaço (no vácuo e sofrendo radiações solares diretas) por pelo menos 10 dias.
Radiação:
Os tardígradas conseguem suportar doses extremamente altas de raios-gama (5.000Gy) e íons pesados (6.200 Gy). Para vocês terem uma noção doses de 5 a 6 Gy já são fatais para nós humanos. Acreditava-se que esta resistência se dava pois como no estado de criptobiose os tardígradas possuem pouca água no seu corpo, haveria poucas substâncias para os íons reagirem. Entretanto, tardígradas hidratados ainda permanecem extremamente resistentes a radiação. Desta maneira acredita-se que esta resistência se dá graças a uma incrível maquinaria de reparo de mutações causadas no DNA.
Os tardígradas são realmente organismos fascinantes e muito resistentes. Um fato curioso sobre eles é que até pouco tempo atrás acreditava-se que o genoma da espécie de tardígrada Hypsibius dujardini possuía uma incrível quantidade de 17% de transferência horizontal de genes, provenientes de bactérias, fungos e vírus. A transferência horizontal de genes ocorre quando há transferência de matéria genético de maneiras distintas à transmissão via parental. Entretanto, um estudo publicado em 2016 mostra que estes valores estão superestimados e que apenas de 1 a 2% do genoma desta espécie é proveniente de transferência horizontal e que aqueles valores altos de 17% eram provenientes de contaminações durante o experimento.
Assistam essa reportagem super legal sobre estes pequeninos da Globo, no Fantástico:
Para aqueles que gostam de teorias malucas é interessante imaginar que os tardígradas, apesarem de não serem ETS, são como uma “cápsula de escape” caso a vida na Terra chegue ao fim. Pensem bem, eles são extremamente resistentes a diversas adversidades, inclusive conseguindo sobreviver no espaço, já possuem uma ampla complexidade biológica, sendo seres pluricelulares, e conseguem se alimentar com pouquíssimo substrato, inclusive de outros de seu próprio grupo e até mesmo de sua própria espécie. Quem sabe se um dia ocorrer alguma catástrofe gigante, com o fim da vida na Terra, os tardígradas ficarão vagando pelo espaço, em criptobiose, até encontrarem um novo planeta onde darão origem a uma nova árvore da vida??